Tuesday, April 3, 2007

"Não tenho filhos e tremo só de pensar.

Os exemplos que vejo em volta não aconselham temeridades. Hordas de amigos constituem as respectivas proles e, apesar da benesse, não levam vidas descansadas. Pelo contrário: estão invariavelmente mergulhados numa angústia e numa ansiedade de contornos particularmente patológicos. Percebo porquê.

Há cem ou duzentos anos, a vida dependia do berço, da posição social e da fortuna familiar. Hoje, não. A criança nasce, não numa família mas numa pista de atletismo, com as barreiras da praxe: jardim-escola aos três; natação aos quatro; lições de piano aos cinco; escola aos seis; e um exército de professores, explicadores, educadores e psicólogos, como se a criança fosse um potro de competição.

Eis a ideologia criminosa que se instalou definitivamente nas sociedades modernas: a vida não é para ser vivida - mas construída com sucessos pessoais e profissionais, uns atrás dos outros, em progressão geométrica para o infinito. É preciso: o emprego de sonho; a casa de sonho; o maridinho de sonho; os amigos de sonho; as férias de sonho; os restaurantes de sonho; as quecas de sonho! Não admira que, até 2020, um terço da população mundial esteja a mamar forte no Prozac.

É a velha história da cenoura e do burro : quanto mais temos, mais queremos. Quanto mais queremos, mais desesperamos. A meritocracia gera uma insatisfação insaciável que acabará por arrasar o mais leve traço de humanidade. O que não deixa de ser uma lástima.

Se as pessoas voltassem a ler os clássicos, sobretudo Montaigne, saberiam que o fim último da vida não é a excelência, mas sim a felicidade!"


Encontrei este texto num e-mail antigo enviado por um amigo. Segundo me foi dito, pertencerá ao jornalista João Pereira Coutinho. Pareceu-me indicado para um post... Nunca é demais recordar que há vida fora de certas paredes!

1 comment:

giò said...
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